Por
qual nome você chama Jesus Cristo? Conheço alguns, todos eles se
referem à essa força mística e misteriosa. Já ouvi Oxalá, Jah,
Krishna, Sidarta Gautama, Mitra, Hércules, Luke Skywalker, sem falar
muitos outros que agora não me recordo. Todos essas entidades foram
heróis, forças descomunais, enviados à Terra para ensinar caminhos
de vida para os seres humanos.
Talvez
eles existiram de verdade, talvez tenham sido mitos, mas qual é a
diferença? Num mundo de verdades plurais, a distância entre verdade
e mito são anuláveis. Cada um segue o caminho que mais lhe tocar.
Assim,
creio que o melhor é aprender com essas entidades, ou mitos, todos
eles ensinam filosofias e estilos de vida válidos até hoje. A raça
humana, enquanto espécie, acumulou muitos saberes ao longo do tempo,
e a forma privilegiada para transmitir essas ideias foram as
narrativas, as histórias, os mitos. Então, nós que aqui estamos
não podemos ser arrogantes ao ponto de negar toda a sabedoria e
conhecimento advindos do o que foi e já não mais é. Por mais que
reinterpretemos essas histórias no hoje, conseguiremos sempre
extrair riquezas filosóficas e espirituais.
Não
consigo negar esses mistérios, basta atentarmos para atmosfera do
dia, conseguimos sentir a melancolia no ar, a morte de Jesus Cristo
nos toca. Independente da minha criação pseudocristã, há nuances
que penetram em nossa sensibilidade e criam esse sentimento de
amplitude e meditação. Estamos vivendo um ritual, uma suspensão e
recriação do tempo.
Infelizmente não sei a fonte da imagem, quem souber me avise. |
Pensemos
na história de Jesus, considerando-o um herói no sentido que Joseph
Campell emprega1.
Ele nasceu de uma força sobrenatural, sem a concepção de um pai
material, mas com uma mãe. Cresceu munido de sabedoria e
curiosidade, um instinto inato de aventura e descoberta. Batalhou por
seus ideais, juntou companheiros e disseminou sua sabedoria entre
aqueles dispostos à ouvi-lo. Contou com o auxilio divino e foi
provado pelo mal, pois deveria aprender a lidar consigo mesmo e com
seus próprios desejos. Foi traído e morreu na cruz, levando consigo
todos os pecados da humanidade, sacrificou-se em prol do seu amor.
Ressuscitou ao terceiro dia, trazendo novas esperanças e sabedorias.
Talvez
não devamos tomar toda essa narrativa literalmente, até mesmo um
respeitável teólogo2
afirma que devemos tomar a Bíblia como um conjunto de símbolos.
Retomando o ponto sobre a pluralidade das verdades, creio que
interpretar essas histórias como mitos carregados de significados
seja mais produtivo do que podar seu potencial criativo colocando-as
na caixa da verdade absoluta.
Assim,
hoje, dia que relembramos solenemente a morte carnal de Cristo3,
precisamos também lembrar que sua trajetória deve ser um exemplo de
vida. Esse ritual é cíclico e acontece todo ano, pois devemos
ressignificar o tempo com mudanças. Sempre morreremos, sentiremos
desgosto, seremos traídos e o sofrimento baterá à nossa porta. Mas
toda vez que tivermos uma luz dentro de nós, uma força misteriosa
que nos impulsiona, poderemos seguir em frente. Através de seu mito,
Cristo nos ensina à enfrentar as dificuldades de nossa vida.
Nessa eterna batalha contra a vida e a morte, só podemos vencer com as armas do simbólico.
Nessa eterna batalha contra a vida e a morte, só podemos vencer com as armas do simbólico.
1Ver
CAMPBELL, J. O Herói de Mil Faces. São Paulo: Cultrix/Pensamento,
1997.
2Ver
BOFF, Leonardo. Cada
um é São Jorge,cada um é Dragão.
3Atualmente,
a escolha da data é feita baseada na primeira lua cheia após o
equinócio da primavera (no Hemisfério Norte) e do outono (no
Hemisfério Sul). Neste caso, a Sexta-feira Santa pode ocorrer entre
os dias 22 de março e 25 de abril.