“Quanto
tempo faz? Já estou aqui há dias, não, semanas… Meu corpo se
esvaí a cada movimento. Sinto que estou perdido. Essa tempestade não
para, e os monstros não param de aparecer”.
No
lugar aonde estava não havia tempo para pensamentos. A Tempestade,
brutal maldição, assola as terras da fronteira pela eternidade,
graças a ela não é possível distinguir o dia da noite. Ventos
poderosos e gotas de água cortante se batiam contra seu corpo, só
lhe era permitido enxergar, em meio à plena escuridão da
Tempestade, devido ao brilho dos relâmpagos que se chocavam contra a
terra rochosa e lamacenta.
Monstros
flutuantes, feitos de eletricidade, apareciam a todo instante. Eram
invocações de Vain, o feiticeiro imortal – as terras da fronteira
eram seu lar e, de lá, ele comandava os exércitos demoníacos que
assolavam o mundo com caos e guerra. Reybold, o capitão da guarda
divina, era um homem obstinado e foi escolhido para realizar uma
missão: invadir as terras da fronteira e encarar Vain.
“Preciso
lutar, preciso seguir em frente! Vou acabar com Vain, vou acabar com
as ameaças do mundo. O medo não perpetuará! Mesmo que toda a
esperança tenha me abandonado, mesmo que todo o meu exército de mil
homens tenha perecido, eu vou seguir em frente. Deus! Por que você
não me ajuda? Por que você não me deu força para proteger meus
homens? Por que você não os protegeu?”.
Contudo,
as certezas de Reybold começavam a se fragilizar. Ele lutava contra
os monstros elétricos ao mesmo tempo que lutava contra sua própria
consciência. Seus olhos já não viam brilho no mundo, apenas morte
e sangue coloriam aquela paisagem. Começará a duvidar dos deuses e
de toda a sua carreira militar, mais de 15 anos supostamente a
serviço de Deus. Sua cabeça tempestuava e girava, assim como sua
espada que atravessava os monstros com golpes brutais. Sua dança era
caótica e confusa, seus pensamentos só lhe traziam mais desespero.
“Como
pode um Deus permitir que haja tanto sofrimento em nome dele? QUINZE
ANOS! Quinze anos lutando em prol de um Deus que nunca me respondeu.
Quantos monstros já não matei? Quantos demônios não exorcizei?
Nunca recebi ajuda de Deus nenhum, apenas eu e meus companheiros
expurgamos o mal da nossa terra suja e abandonada! Meus companheiros…
Todos mortos agora. MALDITOS MONSTROS, saim do meu caminho, não
importa se Deus me abandonou, ou se nunca existiu, vou vingar meus
companheiros!”.
Um
ideal se acendeu em seu coração, um fogo intenso alimentado por um
único objetivo: vingança. Alimentando esse fogo, ele não mais
sentiu o buraco em seu peito que arrasava suas emoções, também não
sentiu mais suas roupas e armadura manchadas com sangue.
Reybold
lutou por horas, sem cessar ou descansar, os corpos se amontoavam
enquanto ele abria caminho pela escuridão da Tempestade. Sua fúria,
seu ódio, seu desejo por vingança lhe impulsionavam e acalmavam sua
mente. Nada existia além de sua vingança, sua concentração se
espalhava por todo o corpo, ele se sentia um com sua espada que
dançava desferindo golpes letais.
Dias
se passaram com a luta de Reybold, e então, em determinado dia,
assombrosamente, se abriu um buraco no céu de onde saia uma luz
vermelha sangue. Desse buraco descia uma figura envolta em trevas
encandecestes. Com um movimento de seu cajado, todos os monstros
elétricos sumiram. A chuva não o tocava, parecia que ela o
respeitava, se desviando por onde aquela figura negra passava. Não
era possível ver seu rosto, mas sua voz retumbou como um trovão.
-
Bravo guerreiro! Reconheço sua força, já fazem dias que você está
em sua jornada incansável, lutando sem trégua contra os meus
monstros. Agora, aqui estou. Sou Vain, o senhor do medo, vim lhe
entregar seu presente final.
Reybold
não era mais capaz de articular palavras, seu pensamento se
transformará numa espiral de ódio, a vingança era o único brilho
que sua mente mantinha. Mas seu corpo e alma reconheceram o som
“Vain”. Uma força animal lhe dizia instintivamente para atacar, essa “ordem” lhe dizia para ser o mais brutal
possível contra aquela sombra envolta em medo. Reybold se desembestou a
correr, com a espada em riste e ódio no olhar desvairado.
Vain
se dignou apenas a levantar seu cajado, com esse mínimo ato ele
suspendeu Reybold no ar.
-
Pobre homem. A bravura e a loucura andam de mãos dadas. Fique feliz,
você vai morrer agora e não haverá nenhum julgamento para sua
alma. Você simplesmente desaparecerá, como o nada que você é!
Nenhum deus vai vir te salvar, pois eu sou o único deus desse mundo.
Eu sou o medo e a morte, Reybolt. Eu sou tudo o que vocês mais temem
desde a aurora dos tempos: o desconhecido. Estou aqui para livrar o
mundo de vocês, homens imundos. Vocês não me deixaram escolha, com
toda a maldade e loucura que exalam… TENHO QUE EXTERMINÁ-LOS!
Vocês são um erro da natureza.
Com essas palavras, a energia cósmica denominada Vain disferiu um
raio negro que desintegrou o corpo de Reybolt. O silêncio voltou a
reinar, apenas se ouvia a chuva que era o prelúdio do crepúsculo da
humanidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário